Os 144 mil na visão Adventista.
Os 144 mil do capítulo 14, os santos do capítulo 13 e o remanescente do capítulo 12 são um só e o mesmo grupo: a igreja de Deus no tempo do fim. Créditos da imagem: Fotolia
O grupo dos 144 mil é mais um dos muitos detalhes do Apocalipse que têm cativado a curiosidade de milhares de cristãos. E não são poucas as hipóteses quanto à identidade deles. Mas, afinal, o que sabemos de certo sobre esse grupo?
No capítulo 7, João descreve os 144 mil como sendo o número dos selados entre todas as tribos de Israel (v. 4-8), o que significa que, por haverem escolhido permanecer leais a Deus, Ele os protege da apostasia e perseguição final (v. 2, 3; cf. Êx 12:7, 12-13; Ez 9:4).
Descrição mais detalhada encontra-se no capítulo 14. Ali, o grupo especial de seguidores de Jesus (v. 4) aparece em pé com Ele sobre o monte Sião (v. 1). Eles parecem ser aqueles que foram perseguidos e condenados por causa de sua lealdade a Deus (13:7) e que, em lugar da marca da besta, trazem em sua fronte o nome do Cordeiro e do Pai (14:1).
Os 144 mil pertencem a Deus; foram redimidos entre todos os povos da Terra (v. 4); entoam um cântico de vitória diante do trono que ninguém pode cantar (v. 3); mesmo que não pudessem comprar nem vender (13:17), Deus os comprou (14:3); eles se diferenciam por não terem se contaminado com mulheres (v. 4), ou seja, não comprometeram sua lealdade a Deus ao entrar em relação com sistemas religiosos falsos (17:1, 2; 18:2-4) e em cuja boca não se achou dolo (14:5). Em 13:7 e 14:12, os 144 mil são descritos como os “santos” de Deus.
O contexto dos capítulos 7 e 14 não deixa dúvida de que os 144 mil são o povo de Deus no tempo do fim. Em Apocalipse 6:12-14, temos a abertura do sexto selo, que se refere aos sinais que antecedem a volta de Jesus. Diante de todas as calamidades impostas por esses sinais, surge a pergunta: “Quem é que pode suster-se?” (v. 17). A resposta vem em seguida: os 144 mil (7:1-8), que são selados pelos anjos de Deus para que sejam protegidos (v. 2, 3).
Já no capítulo 14 a perspectiva não é tanto a da volta de Jesus propriamente dita, mas a da crise religiosa que a antecede (Ap 13). Nesse contexto, os 144 mil são aqueles que aceitam e proclamam a tríplice mensagem angélica (14:6-12). Isso faz dos 144 mil o remanescente de Deus do tempo do fim, grupo introduzido logo antes da descrição do falso culto que seduzirá toda a Terra (12:17), com exceção dos “santos” que não aceitarão a marca da besta (Ap 13:7-10).
Esse é o mesmo grupo que, em seguida ao surgimento da segunda besta, aparece em pé com o Cordeiro sobre o monte Sião (14:1-5). Portanto, não há dúvida de que os 144 mil do capítulo 14, os santos do capítulo 13 e o remanescente do capítulo 12 são um só e o mesmo grupo. Nesse caso, aquilo que é dito acerca do remanescente (12:17) e dos santos (13:10; 14:12) deve se aplicar aos 144 mil.
No entanto, a pergunta mais recorrente quanto aos 144 mil é se o número é literal ou simbólico. Não há dúvida de que ele deve ser tomado simbolicamente. No capítulo 7, a referência aos 144 mil é imediatamente precedida por uma série de símbolos (v. 1-3). O mesmo ocorre no capítulo 14, no verso 4. Não bastasse a referência ao Cordeiro, que é nitidamente simbólica, se o número fosse literal, então os 144 mil, grupo formado por 12 mil fiéis de cada tribo de Israel (7:4-8), seriam apenas judeus cristãos do sexo masculino que nunca foram casados. Conclusão que beira ao ridículo.
No Apocalipse, “mulher” é um termo simbólico (cf. 12:1-6, 13-17; 17:1-8), como o é “Cordeiro” (cf. 5:1-14; 6:1, 7, 12, 16; 8:1; etc.). Portanto, o número 144 mil – 12 x 12 x 1.000 – também deve ser tido como simbólico, e seu significado seria a plenitude do povo de Deus no tempo do fim. A referência às tribos de Israel também reforça essa interpretação. Além do fato de a tribo de Dã estar ausente da lista e a de Manassés tecnicamente ser parte da tribo de José (note que Efraim, irmão de Manassés e filho de José, não é citado), a maior parte das tribos já não existe. Além disso, no Novo Testamento, “Israel” é utilizado simbolicamente como referência à igreja cristã (Rm 2:28, 29; Gl 6:16).
Assim, os 144 mil representam a igreja de Deus no tempo do fim, aqueles que vão resistir às provações que antecedem a volta de Jesus e que estarão em pé com Ele sobre o monte Sião.
WILSON PAROSCHI, doutor em Teologia, com especialização em Novo Testamento, é professor no Unasp, campus Engenheiro Coelho (SP)
Sem sombra de dúvidas, o tópico 144 mil está entre os mais intrigantes não apenas do livro do Apocalipse, mas da Bíblia como um todo. É comum surgirem questões tais como: a quem se refere este número enigmático? Seria uma descrição de povos diversos ou apenas de judeus convertidos ao cristianismo? Seria uma referência aos salvos (judeus ou gentios) de todos os tempos ou apenas daqueles que passam pelo período de provação imediatamente antes da segunda vinda de Cristo? Ainda, seria um número literal ou simbólico? Vamos tratar de algumas dessas indagações e abordá-las, principalmente, com foco nos textos bíblicos de Apocalipse, capítulos 7 e 14.
Quem são eles em relação à época?
Num primeiro momento, trataremos da identidade cronológica deste grupo. É possível verificar se o texto apresenta algumas referências de tempo que auxiliem na situação da época referida aos 144 mil. Uma leitura cuidadosa certamente proporcionará a percepção de que esses selados, em Apocalipse 7, estão em relação cronológica com os sexto e sétimo selos. Conforme nota Osborne, “a passagem de 7:1-8 nos proporciona uma retrospectiva do período imediatamente anterior ao derramamento do juízo divino, e o texto de 7:9-17 nos leva adiante para o período posterior a esses juízos.”[1]
De fato, a descrição dos 144 mil logo após ao clamor dos perdidos, no capítulo 6, é a resposta a esta indagação e revela quem, nos últimos dias, estará em pé no ato da segunda vinda de Jesus[2]. Em linguagem militar, é expresso que os 144 mil, o exército de servos de Deus alistados para a guerra santa, prevalecerão durante a visitação final[3]. Sua localização no desfecho do conteúdo descritivo do sexto selo sugere um interlúdio ou pausa para salientar, de maneira mais direta, o cuidado e recompensa do Senhor quanto ao Seu remanescente fiel.
Deste modo, as duas cenas do capítulo 7 (os 144 mil e a grande multidão de glorificados) atuam enquanto um interlúdio e mesmo um ápice das experiências do povo de Deus. Como Beale destaca, a repetição de histêmi (subsistir), em 6:17 e 7:9, mostra que a pergunta: “Quem poderá subsistir?”, de 6:17, é respondida pela “grande multidão [...] em pé diante do trono”, em 7:9.[4] O fluxo das cenas, portanto, sugere que no devido fim dos tempos haverá um grupo rebelde e desprovido de proteção que enfrentará o juízo divino. E, também, um exército de fiéis protegidos e louvando a Deus pela libertação. E este é o clímax de sua experiência.
Relação com o capítulo 14 de Apocalipse
Outro indicador de tempo para os 144 mil seria a relação com o capítulo 14. Ali se apresenta este grupo tendo o nome de Deus sobre a fronte, o que seria paralelo ao selo do Deus vivo no capítulo 7. Neste caso, a referência ao nome de Deus sobre a fronte aponta para um grupo distinto de fiéis que faz contraste com os demais povos da Terra, os quais nos últimos dias recebem o selo-nome da besta sobre sua fronte. É um grupo que, no capítulo 6, sofre a ira do juízo divino. Em outras palavras, enquanto no capítulo 13 um grupo amadurece em rebelião contra Deus e se identifica à besta recebendo o seu selo-nome, neste mesmo tempo o texto bíblico revela um outro grupo amadurecido e selado com o nome de Deus e do Cordeiro sobre sua fronte.
As passagens se correlacionam paralelamente. Enquanto no capítulo 6 os perdidos dos últimos dias clamam aos montes para que caiam sobre eles, os salvos dos últimos dias, em 14:1-5, são vistos selados com o Cordeiro sobre o Monte Sião. A cena dos 144 mil, em Apocalipse 14:1-5, apresenta a glória reservada àqueles que perseveram sob os ataques perseguidores da besta nos últimos dias segundo Apocalipse 13:11-18. Fatos que situam esse grupo na época imediatamente antes da segunda vinda.
Quem são eles em relação à quantidade?
Embora haja a proposta de que este seja um número literal, essa opção enfrenta alguns problemas que a torna inviável. Ou seja, se o número necessariamente for tomado literal, seu contexto imediato também o deve ser. Nestes termos, os 144 mil selados obviamente seriam compostos de judeus homens condicionados à guerra, o que exclui a presença de crianças, mulheres e mesmo homens acima dos 40 anos.
Acrescenta-se, ainda, a informação de que seria um grupo de solteiros que nunca tiveram vida íntima com mulheres porque são castos-virgens (14:4). Além disso, a sugestão de literalidade quanto a esse número encontra o problema da ascendência biológica das doze tribos que praticamente se estilhaçaram no período do exílio e grande parte era absolutamente inexistente nos dias de João.
Identidade do grupo
Um outro fator importante para categorizar os 144 mil seria a noção de uma característica de escrita que João parece seguir. É dito reiteradas vezes que João ouviu alguma coisa e, então, virando-se vê outra. Porém, o que ele vê não é algo essencialmente diferente daquilo que ouvira, e sim a mesma coisa descrita em outras palavras.[5] Ou seja, em Apocalipse 1 ele ouve acerca de “uma voz como de trombeta” e então vê um como o Filho do Homem, ambas informações referentes a um único ser, Jesus Cristo.
Ouve acerca de “sete igrejas” e, então, vê sete candeeiros de ouro. De maneira semelhante, e não duas realidades distintas, mas duas descrições do mesmo objeto, no caso, as sete igrejas da Ásia. Este mesmo padrão se dá em Apocalipse 5:4-5; 17:1-3 e 21:1-3. Logo, este fenômeno não deveria ser ignorado no capítulo 7. Nele, João ouve um número de selados e então vira-se e vê uma multidão que ninguém podia enumerar, de modo que aqui não teríamos duas realidades diferentes, mas sim duas descrições da mesma coisa, ou seja, os 144 mil e a grande multidão do capítulo 7 são duas descrições do mesmo grupo de pessoas.
Deste modo, as duas cenas dos 144 mil e a multidão incalculável se tratam de duas imagens descritivas da mesma mensagem: Deus protege e salva o seu remanescente. A segunda cena fortalece e amplia a primeira.[6] É significativo, neste segmento, o proposto por Jacques Doukhan de que as duas cenas sejam descrições do mesmo grupo em dois momentos distintos[7]: a primeira o exército militante em pé pelo Senhor e sua causa nos últimos dias e a segunda esse mesmo exército triunfante na glória eterna.
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